Embora seja possível constatar avanços e tentativas plausíveis para maior proteção legislativa, ainda há um longo caminho pela frente, que exige uma resposta rápida e rigorosa contra atos atentatórios aos direitos animais.
O diálogo inicial propõe uma reflexão que analisa pesos e contrapesos de forma serena, porém, deixa de lado pensamentos sabidamente retrógrados parcela da sociedade que, claramente, são embasados em falta de lógica argumentativa, para não dizer “burrice”.
Frequentemente, encontramos teses que tentam justificar a “desnecessidade” de renovação da legislação ou debates sobre a necessidade de proteção animal, sob o ilusório pretexto de que também existem pessoas passando fome, que são maltratadas, que a legislação deveria ter como foco absoluto as pessoas e que os animais deveriam ficar em segundo plano.
Nos debates políticos das últimas eleições municipais de 2024, também foi possível notar uma abordagem de crítica a projetos de hospitais públicos para animais, sob o fraco argumento de que o foco deveria ser apenas a saúde das pessoas.
Para alguns parece óbvio que argumentos como estes são desprovidos da chamada lógica argumentativa, porém, infelizmente, não é para todos. Explico: é que, em verdade, uma coisa não tem nada a ver com a outra.
Quem estuda orçamento público sabe que é altamente possível e viável a separação de verbas de forma temática e é óbvio que para que uma sociedade evolua, é necessário analisar sua estrutura de forma multidisciplinar, é como na vida: não dá para cuidar apenas da saúde física e esquecer da mental; não dá para cuidar só do financeiro e esquecer do familiar; quando não se distribui os pesos de forma equitativa, o caos é certo, em qualquer área que seja. No orçamento e na gestão pública também é assim. Daí o porquê ser necessário repisar: uma coisa não tem nada a ver com a outra ou, como diria o Kibe* (Kibe Loco), “Cada um no seu quadrado”.
Tá, mas por que reforçar este ponto logo de saída? Respondo: embora a justiça devesse – em minha perspectiva – desconsiderar opiniões descompassadas com a lógica teórica básica, na prática, a justiça e a sociedade são feitas através de políticas e, as políticas, todos nós sabemos, consideram até mesmo as opiniões mais esdrúxulas – infelizmente. Destarte, faz-se oportuno separar “o joio do trigo”, pois, como dito, temas que para alguns saltam aos olhos, para outros, colírio ainda é pouco.
Agora, feita a introdução separatória (uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa), podemos analisar apenas o que nos interessa neste artigo: os direitos dos animais. E nesta linha, podemos observar que a legislação tem criado mecanismos de proteção ou de melhoria da situação de desamparo. Podemos citar, por exemplo, a legislação sobre os Crimes Ambientais, a Lei 14.064/2020, que aumentou a pena para maus-tratos de cães e gatos. Além disso, é possível observar movimentos na legislação estadual, projetos de Lei de ampliação protetiva no Congresso Nacional e multas para determinados riscos e descuidos na legislação municipal. Porém, tais movimentos não têm se mostrado tão eficazes como poderiam ser.
Ou seja, percebemos que a cultura é um fator de influência da ação humana. É comum observarmos hoje, por exemplo, a “Vaquejada” e nos lembrarmos da era dos Gladiadores do Coliseu de Roma (guardadas as proporções), quando, o que o povo [em tese] queria, era ver um espetáculo bárbaro. Fazia parte da tradição e da cultura que, com o tempo, foi transformada.
Porém, o foco aqui não é tratar da Vaquejada ou dos Rodeios, até porque, envolve um debate sobre as tradições e culturas enraizadas, além de um debate sobre o efeito “Backlash” no mundo jurídico. Ainda assim, neste arcabouço, fica perceptível que a cultura se transforma com o tempo, a exemplo da era dos Gladiadores (que agora estão também no octógono do UFC, numa batalha bem menos letal).
O que resta evidente é que penalidades brandas não são um bom remédio para o respeito social. Claro que a legislação e a cultura social exigem transformação gradativa. Todavia, isto não é desculpa para fechar os olhos para quem comete maus-tratos nas suas mais variadas formas – pelo contrário – é necessário criar uma legislação, de veras, protetora e punitiva, onde aquele que agir com maldade contra um animal dócil e indefeso, seja severamente punido. A transformação da sociedade e a proteção, em determinados momentos, deve exigir mãos fortes e irredutíveis.
Por fim, fica evidente que uma legislação rígida e protetora, em especial para quem comete – de fato -, maus-tratos contra animais dóceis e indefesos, pode reprimir ou inibir de forma ostensiva tais condutas, pois é a forma de exigir a imperatividade do Estado. Alguns valores sociais devem ser inegociáveis – dentre eles, a severa punição da lei contra aqueles que ignoram os indefesos.
Por Nelson Gazolla
Jornalista digital (MTb 74.409/SP – Decisão STF); atuou com gestão de políticas públicas sociais e culturais por mais de 10 anos; também trabalhou com gestão digital e informação para empresas como Band e Embraer; foi servidor público concursado. É estudante do 5º ano de direito e empresário.